O silêncio de Bukowski… e o nosso

Charles Bukowski vivia e escrevia intensamente, e este é um de seus grandes méritos. Sua poesia estava à flor da pele e sua vida de excessos era fielmente retratada em seus versos. Durante seus últimos anos de vida, fisicamente debilitado por uma leucemia, escreveu alguns versos especialmente belos sobre o tempo passado no hospital e a vida que, se perdia em intensidade, ganhava muito em profundidade e reflexão.

Em seu poema cancer, escrito pouco tempo antes de morrer em um hospital da Califórnia, podemos ter uma vaga ideia da solidão que o assolava. Perdido no tempo e isolado no espaço, o poeta já se dá por vencido. A última aposta já foi perdida e o que resta é esperar o silêncio completo da sepultura onde só os ossos permanecerão. Sem mais versos, o silêncio é a morte do poeta.

A morte de Bukowski virou (ótima) poesia. Mas essa triste solidão dos moribundos é a regra para tantos anônimos que morrem diariamente em hospitais. Seja de câncer, de infarto ou de covid, morrer sozinho é sempre uma das coisas mais tristes que podemos experimentar ou permitir. Ninguém deveria encerrar a aventura de uma vida sem a mão de uma pessoa querida a segurar a sua até o final.

Se havia algum movimento inicial da medicina no sentido de humanizar a morte por meio da ampliação dos cuidados paliativos, isso parece ter sido em grande parte esquecido na crise atual. Morrer é da vida, mas morrer obrigatoriamente sozinho é uma decisão de todos. E nosso silêncio é ensurdecedor.