
Na época em que Emily Dickinson criava sua delicada poesia, a morte era bem diferente do que vemos hoje. As mortes e os rituais que a acompanhavam, antes e depois do evento, costumavam acontecer na própria casa das pessoas. Era como se a casa se impregnasse de morte. E isso fazia com que todos por ali tivessem que encará-la à sua maneira. Não havia como escamotear a morte ou fugir dela.
Atualmente, vivemos uma época em que a morte costuma ocorrer longe de nossos olhos. Dessa maneira, não vivenciamos a morte de nossos familiares e amigos e nem mesmo a nossa própria morte. Isso para alguns autores representa uma perda ainda maior que a própria morte, já que nos deixa ainda mais despreparados para aquele momento que, segundo Montaigne, é o mais importante de nossas vidas.
Chegamos a transformar a morte em um “não acontecimento” ao permitir que ela ocorresse longe dos olhos da família e com o próprio moribundo inconsciente e alheio à própria morte. Ainda que isso possa ser algumas vezes inevitável, é evidente que a frequência com que isso ocorre representa mais uma conveniência técnica que um desejo consciente da sociedade.
O importante é que uma mesma morte (assim como a própria vida) pode ter significados diferentes para todas as pessoas que a presenciam. É nessa hora que a delicadeza e a profundidade dos poetas podem fazer nosso pensamento ir além de nossos limites. Enriquecidos pela beleza de suas metáforas e perífrases, podemos ver até mesmo a beleza onde muitos só enxergariam dor e sofrimento. Salvos pela arte, passamos a entender que a morte, mais do que um fim, pode representar uma libertação.
